30.5.08

O meu espaço é onde vivem certos nomes, pouco importa a geografia.




Laurie Tumer

Aqui é onde vivo agora e é quasi primavera. Vê-se.
Antigamente, isto é, antes, as coisas deste lugar, as pedras, as plantas, os sons, tomavam-me como se de passagem.
Agora vivo aqui. Perceberam que vivo aqui.
Viver num lugar obriga a certas atitudes conjugadas com esse lugar.
Tenho que estar atenta.

(...)

Maria Keil

Afinal já não chove e, depois de tantos anos, ainda me comovo com a primavera.

Espaço : chuva de Maio


Maggie Taylor


hoje chove muito, muito,
dir-se-ia que estão a lavar o mundo.
o meu vizinho do lado vê a chuva
e pensa em escrever uma carta de amor
uma carta à mulher com quem vive
e lhe faz a comida e lava a roupa e faz amor com ele
e se parece com a sua sombra
o meu vizinho nunca diz palavras de amor à mulher
entra em casa pela janela e não pela porta
por uma porta entra-se em muitos sítios
no trabalho, no quartel, na prisão,
em todos os edifícios do mundo
mas não no mundo
nem numa mulher
nem na alma
quer dizer
nessa caixa ou nave ou chuva que chamamos assim
como hoje
que chove muito
e me custa escrever a palavra amor
porque o amor é uma coisa e a palavra amor é outra coisa
e só a alma sabe onde as duas se encontram
e quando
e como
mas que pode a alma explicar
por isso o meu vizinho tem tempestades na boca
palavras que naufragam
palavras que não sabem que há sol porque nascem e morrem na mesma noite em que ele amou
e deixam cartas no pensamento que ele nunca escreverá
como o silêncio que existe entre duas rosas
ou como eu
que escrevo palavras para regressar
ao meu vizinho que vê a chuva
e à chuva
ao meu coração desterrado

Juan Gelman


29.5.08

O presente no espaço


?

Existe somente uma idade para a gente ser feliz,
somente uma época na vida de cada pessoa em que é possível
sonhar e fazer planos e ter energia bastante para realizá-los a
despeito de todas as dificuldades e obstáculos.
Uma só idade para a gente se encantar com a vida e
viver apaixonadamente
e desfrutar tudo com toda intensidade
sem medo nem culpa de sentir prazer.
Fase dourada em que a gente pode criar e recriar a vida à nossa
própria imagem e semelhança
e vestir-se com todas as cores
e experimentar todos os sabores
e entregar-se a todos os amores
sem preconceito, nem pudor.
Tempo de entusiasmo e coragem
em que todo desafio é mais um convite à luta que
a gente enfrenta com toda disposição de tentar algo novo, de
novo e de novo, e quantas vezes for preciso.
Essa idade tão fugaz na vida da gente chama-se PRESENTE e
tem a duração do instante que passa .

Mário Quintana

O espaço que não deve parecer impossível de mudar



Michael G. Magin
Fernand Khnopff

Desconfiai do mais trivial,
na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente:
não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,
pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar.

Bertold Brecht

A primeira imagem não me agrada muito e gosto da estranheza da segunda.
Talvez as tenha escolhido por isso mesmo, porque a combinação das duas não me é familiarmente suave.

Admito que não sei bem o que pretendo dizer. Apenas que o texto me fez pensar.
Sem esquecer o mundo grande que B. B. fala, é pelo pequeno e que levamos por dentro que é mais possível começar.

27.5.08

Voz e cordas soltas no espaço


Johanna Wright

26.5.08

O espaço de um instante em perda




Joakim Eskildsen


No caminho onde aprendi o outono
sob o azul magoado
os pescadores cruzavam ainda linhas
províncias clareiras
e esse gesto masculino de apagar a dor

chegava pelos percalços da terra
o carro do gelo
e os miúdos tiravam bocados para comer às dentadas
em retrato selvagem mas, juro-vos, havia encanto
havia qualquer coisa,
outra coisa nesse instante em perda

as mulheres sentavam-se à porta com os bordados
quando passavam estrangeiros
ficavam sempre a sorrir nas suas fotografias

José Tolentino Mendonça

Aumentar é um espaço obrigatório.


Nanako Koyama


É próprio do amor
(...)
ser obrigado a aumentar, sob pena de enfraquecer

André Gide

Há quem diga que o tempo nos cala, que ainda é inverno e que o mundo quase acabou mas, ontem, encontrei da janela, uma árvore que cresce de gestos pequenos e bilhetes de amor.

21.5.08

Espaço : deixa o tempo fazer o resto


Parallax(e)

deixa o tempo fazer o resto
fechar as janelas
aplacar os barcos
recolher os víveres
semear a sorte
acender o fogo
esperar a ceia

abre as portas: lê a luz
a sombra, a arte do passarinheiro

com três paus
fazes uma canoa
com quatro tens um verso,
deixa o tempo fazer o resto.

Ana Paula Inácio

19.5.08

Espaço : transformar


Robert & Shana Parkeharrison

Qual é a ligação entre o Homem e a borboleta?

O teu riso no espaço

Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.

(…)

Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar, a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.

Pablo Neruda

16.5.08

Alegria espaço alegria


Sanna Kannisto (alterado)


Contribuir para a alegria.
Contribuir para o aumento do: olho-te com PASMO, surpreendo-me e gosto.
Contribuir para o afinal deus e o anjo.
a qualidade da existência.
a dança na cave ser como as nuvens: ameaçar cair e não cair.
Contribuir para a população dos Alegres
Fazer Filhos na população dos Alegres
Mas Não é o Alegre do Sorriso Maravilhado Parvo.
É alegre alegre.
O coração bate no meio do jogo. O coração aumenta as ideias o coração bate no meio do jogo, aumenta s ideias dos alegres, as ideias dos alegres são o coração.
Não é não pensar. Não é o INSTINTO. O Imediato.
É a proporção do Metade transparente metade quadro.
o corpo deixa ver para o outro lado e deixa-se ver.
o corpo deixa-se ver e deixa ver para o outro Lado.
Proporção entre o Transparente e o Quadro: o Coração.
(as ideias dos alegres são o Coração).

Gonçalo M. Tavares

O que mais me impressiona é que a alegria não é só rosto, plástica e fugaz.
Pode coexistir com a dor.

14.5.08

Espaço : basta crer...




Peter Hebeisen
Louis Greenfield




Creio na poesia, no amor, na morte,
e por isso mesmo
creio na imortalidade.

Giánnis Ritsos

13.5.08

Até ao último espaço.


Egon Schiele (pormenor)

Mas há a vida
que é para ser
intensamente vivida, há o amor.

Que tem que ser vivido
até a última gota.
Sem nenhum medo.
Não mata.

Clarice Lispector

12.5.08

Espaço : tudo te será dado


Frank Boenigk (alterada)


Na sombra qualquer passo significa.
Fecha-te e escuta:
verás surgir na obscuridade
as brasas da memória,
a gotejar de um deserto,
o cheiro húmido.
Fecha-te e escuta
e não esperes nada,
tudo te será dado:
na sombra os triunfos
contam-se por clarões,
e o clarão basta
no fundo do coração
para chegar a compreender.

Àlex Susanna

10.5.08

Subitamente no espaço


Carla Van de Puttelaar


E de súbito desaba o silêncio.
É um silêncio sem ti,
sem álamos,
sem luas.

Só nas minhas mãos
oiço a música das tuas.

Eugénio de Andrade

Espaço : cada árvore é um ser para ser em nós




Lisa Congdon

Cada árvore é um ser para ser em nós
Para ver uma árvore não basta vê-la
a árvore é uma lenta reverência
uma presença reminiscente
uma habitação perdida
e encontrada
À sombra de uma árvore
o tempo já não é o tempo
mas a magia de um instante que começa sem fim
a árvore apazigua-nos com a sua atmosfera de folhas
e de sombras interiores
nós habitamos a árvore com a nossa respiração
com a da árvore
com a árvore nós partilhamos o mundo com os deuses

António Ramos Rosa

8.5.08

Conta-me outra vez o teu espaço


?
Conta-mo outra vez: é tão bonito
que não me canso nunca de escutá-lo.
Repete-me outra vez que o par
do conto foi feliz até à morte.
Que ela não lhe foi infiel, que a ele nem sequer
lhe ocorreu enganá-la. E não te esqueças
de que, apesar do tempo e dos problemas,
continuaram beijando-se cada noite.
Conta-mo mil vezes por favor:
é a história mais bela que conheço.

Amalia Bautista

7.5.08

Espaço : quebrar um grilhão da corrente


Parallax(e)

Livre não sou, que nem a própria vida
Mo consente
Mas a minha aguerrida
Teimosia
É quebrar dia a dia
Um grilhão da corrente.

Miguel Torga

5.5.08

Escuta o espaço...


Beatriz Martín Vidal


Escuta, eu não quero contar-te o meu desejo
Quero apenas contar-te a minha ternura...


Manuel Bandeira

1.5.08

Espaço para nada mais


Brookem Danno (alterado)

Agora sei que o amor nos faz aproximar as coisas, habitá-las, que pelo amor as reconhecemos e que, depois de lhe recebermos a revelação, nada mais é preciso para nos sentirmos vivos.

Fernando Namora